segunda-feira, 30 de março de 2009

MILÍCIA EXPULSA IGREJA CATÓLICA DE RIO DAS PEDRAS




Milicianos expulsam Igreja








Indiciado pela CPI das Milícias, presidente da Associação de Moradores de Rio das Pedras despeja pastoral de prédio em que eram realizados trabalhos comunitários e serviços gratuitos na comunidade


Rio, 30/03/2009 - Se a fé move montanhas, a milícia remove a igreja. Há duas semanas, a Associação de Moradores de Rio das Pedras, em Jacarepaguá, deu ultimato à Igreja Católica: mandou desocupar o prédio do centro pastoral. O prazo para a entrega das chaves é de 60 dias e expira em 5 de maio. A área, com pouco mais de 150 metros quadrados, foi cedida há nove anos por comodato à Paróquia de Nossa Senhora do Loreto. Lá acontecem missas, catequeses e serviços sociais mantidos pelos religiosos.

A intimação foi entregue na pastoral pelo presidente da associação de moradores, Jorge Alberto Moreth, o Beto Bomba, acompanhado de dois homens armados que seriam seus guarda-costas. Eleito líder comunitário em dezembro, ele foi indiciado pela CPI das Milícias por ligação com paramilitares que exploram serviços na comunidade e cobram taxas de moradores.

A ordem de despejo do Centro Pastoral, segundo religiosos, seria uma retaliação dos líderes da milícia à Igreja Católica por não permitir o controle dos donativos e do trabalho social feito na comunidade. Oficialmente, a associação não deu satisfação à Paróquia de Nossa Senhora do Loreto. Apenas avisou que precisava do prédio para “fazer serviços comunitários”.

“Não sei os motivos para o despejo. Mas é verdade que a Igreja não faz acordos com grupos quando percebe que o trabalho pode ser usado politicamente”, explica o padre Luís Antônio, da Arquidiocese do Rio. A luta da Igreja Católica agora é para concluir rapidamente as obras de construção da capela de Nossa Senhora Mãe da Divina Providência e São João Batista, que está sendo erguida na comunidade. O fim dos trabalhos estava previsto dezembro de 2010.

Se não terminar a obra da igreja em dois meses, a paróquia não sabe o destino dos serviços sociais, dos encontros de jovens e casais e as reuniões de preparação para casamentos e batizados que são oferecidos no centro pastoral.


João Antônio Barros


Fonte: O Dia

domingo, 29 de março de 2009

DUALIDADES


Dualidades.



por Paulo da Vida Athos.


Não conheço quem do amor diga palavras certas, de precisão, nem mesmo incertas, que o defina quando nos rasga fibra por fibra, quando tudo em derredor é aurora e luz, ou quando nos isola imersos na solidão dos desnascidos, embalados no esgar insone das madrugadas ou no espanto das manhãs ensolaradas.


Não ouvi ser derramada da boca do douto ou do ébrio, do profeta ou do louco, nem da prancheta dos poetas visionários, a fórmula que o defina, a razão de nele perdermos a razão, de deixar-nos de rastros enquanto nos julgamos a voar em céus de inexistentes mundos, ou de olharmos um vagabundo reverenciando-o como se fosse um rei, ou uma puta como se santa fosse, no apogeu de um milagre.


Nunca vi nascer, da suavidade dos pincéis ou da dureza dos cinzéis, a resposta em forma ou em cores, que revelasse esse sentimento que como lente projetiva inverte nossas idas tornando-as voltas, todos os nossos risos em mágoas, a lisa flor da água em ondas revoltas, na imensidão de nosso mar interior.


Há uma lente especial que nos orienta o olhar e nos mostra a verdade do amor quando imersos em amor caminhamos na vida. É uma verdade dele, do amor, não nossa nem da vida. É a verdade dos insanos, porque amar é isso mesmo, uma insanidade de alma que nos conduz sorrindo aos infernos ou ao paraíso, que nos anestesia através de um sorriso, de um olhar ou do perfume de uma lembrança, enquanto nos vai rasgando com suas garras como o condor faz com suas presas.


Há nele uma música de encantamento, como uma flauta hameliana a nos fazer bailar na alegria ou na tragédia, que faz a gente ser capaz de chorar ao dar vida à vida ou permanecer sorrindo ao dançar com a morte, como se a realidade fosse um palco imenso e a vida apenas a platéia que ali estivesse para aplaudir seu diretor, o amor, e seus atores, nós, diante do mortal e derradeiro ato.


Há no amor esses insondáveis mistérios e escolhas. Nada nos mergulha em dor mais profunda, nada nos imerge em êxtases mais fantásticos. Enquanto amantes somos capazes dos atos mais nobres e engrandecedores, assim como as mais agudas covardias e baixezas. Ele nos eleva até onde jamais conseguiríamos chegar sem ele, mas nos humilha de forma tão profunda que, em muitas das vezes, não conseguimos mais nos levantar. Há nele essa sordidez da posse pela posse. Há nele o altruísmo só encontrado na mulher, quando mãe. Não o escolhemos, não o convidamos. Não lhes damos ordens nem o expurgamos. Somos apenas, os eleitos. Eleitos e, dele, escravos!


Essa dualidade fantástica que nele existe, que nos eleva para o deleite da vida mas que nos pode fazer beber na lama do chão, é que o torna primo entre os sentimentos. Com ele alçamos nossos vôos mais altos, com ele, da mesma forma, rastejamos nosso orgulho pelo chão.


No entanto, não há nessa terra ser humano que possa, sem um dia o ter abrigado na alma, dizer no instante final em que for se despedir da vida:


-“Sorriam todos! Afinal, vivi!”

sábado, 7 de março de 2009

STJ TIRA PRESTAÇÃO JURISDICIONAL DA IDADE MÉDIA


STJ começa a devolver processos em papel aos tribunais de origem


A partir da semana que vem, o Superior Tribunal de Justiça começa a devolver aos Tribunais de Justiça e Tribunais Regionais Federais os processos em papel que foram digitalizados e transformados em arquivo eletrônico. Hoje, a Secretaria Judiciária do STJ baixou oficialmente o primeiro lote com 1.346 processos que serão enviados aos tribunais de origem nesta segunda-feira. Segundo a secretária judiciária, Maria Aparecida do Espírito Santo, a meta é devolver de 1.000 a 1.500 processos por semana.

A substituição dos processos em papel vai gerar expressiva economia de espaço, dinheiro e tempo com o transporte dos autos. E, principalmente, vai agilizar os trabalhos na Corte e fazer com que a decisão judicial chegue mais rápido ao cidadão. Com a tramitação virtual, o processo é automaticamente distribuído ao gabinete do ministro pelo sistema, sem a necessidade do trânsito físico de papel.


Cinqüenta e cinco scaners estão operando 12 horas diariamente na digitalização dos processos recebidos no STJ. A meta é digitalizar cerca de 450 mil processos até o final de agosto. Ainda neste semestre, cerca de 300 mil processos serão devolvidos aos tribunais de origem, que ficarão responsáveis pelo armazenamento dos autos que foram digitalizados.


Além de otimizar a tramitação dos processos, o sistema vai facilitar o acesso de advogados e partes aos recursos digitalizados. O acesso que atualmente só pode ser feito na sede do STJ e no horário de funcionamento do Tribunal (das 7h às 19h), poderá ser feito 24 horas por dia, de qualquer computador, em qualquer lugar com acesso à internet.


Na foto Maria Aparecida do Espírito Santo, secretária Judiciária do STJ.

Fonte: STJ

terça-feira, 3 de março de 2009

STF CENSURA A CENSURA ESTATAL


Ministro mantém indenização à Tribuna da Imprensa por censura durante ditadura (íntegra da decisão)

Ao determinar o arquivamento do Recurso Extraordinário (RE) 487393, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Celso de Mello manteve o direito do jornal "A Tribuna da Imprensa" de receber indenização da União Federal por danos sofridos por atos de censura praticados durante o regime militar. O ministro concluiu que não existe matéria constitucional em discussão que justifique a análise do recurso pela Corte Suprema, e ainda salientou seu ponto de vista, no sentido de que a censura estatal é intolerável.

Após perder na primeira instância e no Tribunal Regional Federal (TRF) da 2ª Região, a União tentou recorrer ao Supremo para reverter a condenação. A fim de afastar sua obrigação de reparar os danos causados ao jornal pela censura, a União alegava não haver “nexo de causalidade a ensejar uma responsabilidade objetiva, o que invalida o conteúdo probatório da presente demanda”.

Celso de Mello explicou que a existência ou não de nexo de causalidade material não pode ser questionada por meio de Recurso Extraordinário, “por supor o exame de matéria de fato, de todo inadmissível na via do apelo extremo (Recurso Extraordinário)”.

Direito positivo

Sobre este aspecto, contudo, Celso de Mello teceu considerações sobre a teoria do risco administrativo. O ministro explicou que este conceito serviu como fundamento à norma de direito positivo que instituiu, em nosso sistema jurídico, “a responsabilidade civil objetiva do Poder Público, pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, por ação ou por omissão”. Essa concepção teórica fez surgir, conforme o decano do STF, o dever do Estado de indenizar suas vítimas por danos pessoais ou patrimoniais sofridos.

As circunstâncias do caso de A Tribuna da Imprensa, apoiados em provas abundantes nas instâncias ordinárias, acentuou o ministro, “evidenciam que se reconheceu presente, na espécie, o nexo de causalidade material”.

Censura intolerável

Mesmo não analisando o mérito da questão, Celso de Mello fez questão de salientar, como obter dictum (comentário incidental), seu entendimento no sentido de que a censura estatal é intolerável, e pode legitimar o dever governamental de reparar, no plano civil, danos morais ou materiais causados aqueles que a sofreram – como no caso da Tribuna da Imprensa.

“Tenho observado que se intensificou, em nosso sistema jurídico, o grau de proteção em torno da liberdade de informação e de manifestação do pensamento, disse o ministro. “Não se pode transigir em torno de direitos fundamentais”, ressaltou Celso de Mello, fazendo referência ao exercício concreto da liberdade de expressão por parte da imprensa.

Ao se referir às críticas do jornal Tribuna da Imprensa, que geraram a censura feita pelo governo militar, o ministro salientou que “em uma sociedade fundada em bases democráticas, mostra-se intolerável a repressão ao pensamento, ainda mais quando a crítica – por mais dura que seja – revele-se inspirada pelo interesse público e decorra da prática legítima de uma liberdade pública de extração eminentemente constitucional”, concluiu Celso de Mello.

Com a decisão, o processo será arquivado e a indenização paga, caso não haja recurso da União.


Fonte: STF

segunda-feira, 2 de março de 2009

A AGONIA COMO PENA















A agonia como pena



Henrique Júdice Magalhães




O sistema penitenciário brasileiro caracteriza-se desde sempre pelas condições infra-humanas a que relega seus internos. Sua realidade (superlotação, tortura, insalubridade) já foi denunciada nas páginas de AND pelos advogados Nilo Batista e Augusto Thompson (edição 27) e pelo juiz Livingsthon Machado (edição 29). Tal quadro constitui uma afronta diária ao dispositivo constitucional que diz que ninguém será submetido a tratamento desumano ou degradante (artigo 5º, III), bem como a todos os tratados e convenções de direitos humanos subscritos pelo Brasil. No final de 2005, o país foi admoestado pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos para que adotasse providências visando garantir condições mínimas de vida aos presos.

No entanto, sucedem-se iniciativas destinadas a piorar a situação existente. Se as condições habituais dos presídios chegaram ao ponto em que estão por um descaso consciente, ainda pior é o conjunto de suplícios elaborados e defendidos nos últimos anos por setores do aparato jurídico-policial e seus representantes parlamentares, caracterizados por requintes de crueldade.

Desde 2001, existe em São Paulo o chamado RDD (Regime Disciplinar Diferenciado), criação do ex-secretário estadual de Administração Penitenciária, Nagashi Furukawa. O RDD, que abrange até mesmo presos provisórios (sem condenação), foi instituído pela resolução 026 da Secretaria de Administração Penitenciária (SAP). Esta resolução limita a duração das visitas a duas horas por semana e determina que sejam confinados em cela de isolamento, por até 360 dias, "líderes e integrantes das facções criminosas" e "presos cujo comportamento exija tratamento específico". A avaliação desta necessidade ficou ao critério do diretor do presídio, sem necessidade sequer de que o preso pratique ato classificado como falta grave na Lei de Execuções Penais.

É justamente no poder conferido aos diretores das unidades prisionais que reside, na prática, o pior aspecto do RDD. A resolução diz, por exemplo, que a duração dos banhos de sol deve ser de "no mínimo" uma hora por dia. Na prática, nunca ultrapassa isto.

Em 2002, a Resolução 049 da SAP restringiu o acesso dos presos submetidos ao RDD a advogados, estabelecendo a exigência de que as visitas fossem agendadas após requerimento do preso ao diretor do presídio. Na prática, o que ocorre é que, se o diretor negar ao preso o agendamento, este não tem sequer a quem reclamar, pois seu advogado nem ficará sabendo o que houve. A resolução chegou a ser suspensa liminarmente pelo Judiciário, mas teve sua validade restaurada. É vedado o contato físico entre o preso e o advogado: eles conversam através de microfone, separados por uma grossa parede de vidro.

Pior que o regime em si são os presídios reservados a seu cumprimento: o anexo da Casa de Custódia de Taubaté (conhecido como Piranhão) e os presídios de Avaré, Iaras, Presidente Venceslau e Presidente Bernardes são os piores estabelecimentos de São Paulo. Foi no Piranhão que começou a surgir, há aproximadamente dez anos, o Primeiro Comando da Capital (PCC), inicialmente com o propósito de resistir às torturas e arbitrariedades praticadas.


Celas tipo F

"(...) o prisioneiro fica preso numa cela individual, de 2x3 metros, cujo acesso é por uma porta blindada. As quatro paredes estão pintadas, uniformemente, com um branco monótono. A comida é passada através de um buraco, como se faz para alimentar uma besta. O conjunto é silencioso e o mundo físico do prisioneiro é reduzido a uma distância de três metros, circundado a um silêncio angustiante."

Esta descrição de uma prisão turca do chamado tipo F, reservada a ativistas politicos, consta de uma carta de denúncia subscrita por uma entidade européia de direitos humanos a respeito das condições em que está preso o militante comunista Ercan Kartal. Ela poderia, no entanto, servir para descrever as condições dos presos de Presidente Bernardes.

Não se trata de uma penitenciária comum. O presídio de Presidente Bernardes foi projetado e construído em 2002 especialmente para servir de campo de concentração. As condições inóspitas e desumanas em que vivem os encarcerados não decorrem, ali, apenas de negligência ou boçalidade, mas de um requintado planejamento.

O piso das celas tem um metro de espessura e é revestido por chapas de aço. As celas são individuais e não há contato entre os presos sequer no banho de sol. Recolhidos a cubículos de seis metros quadrados com grossas portas de aço, janelas com vidros blindados e grades de ferro e sem separação entre banheiro e dormitório, os internos são submetidos a uma forma sofisticada de tortura.

Os presos só podem receber de seus familiares, uma vez por mês, alimentos previamente determinados pela Secretaria de Administração Penitenciária. Não há visita íntima, nem a tal assistência "espiritual e religiosa", embora esta seja expressamente assegurada pela Constituição. A leitura de jornais é proibida e o preso só pode se comunicar com o mundo exterior por correspondência escrita, que é alvo de censura pela direção da unidade. O contato físico com as visitas também está proibido.


Tortura

Já na época da criação do regime, a procuradora do estado de São Paulo Carmem Silva de Moraes Barros classificou-o como "método de aniquilamento de personalidades". Em longo artigo publicado em março deste ano, com o título "A tortura no RDD", a psiquiatra Guanaíra Rodrigues do Amaral, da Ação dos Cristãos pela Abolição da Tortura - ACAT, descreve detalhadamente as implicações médicas e sociais da tortura psicológica inerente ao RDD sobre a vítima e seus familiares.

Guanaíra explica que a tortura mental, assim como a física, "compõe-se de várias modalidades, entre elas, a privação sensorial, causada pelo isolamento em celas fechadas, tipo "solitária", com pouca alimentação, pouco contato com outros e quase nenhum contato físico, nenhum exercício físico, quase nenhuma informação do mundo exterior e etc.; e com duração longa, chegando até a meses de isolamento. Este tipo de tortura - a privação sensorial - foi considerado por médicos, especialistas, e defensores de direitos humanos e por todas as Convenções e Tratados de Direitos Humanos relacionados com a questão da tortura, como responsável por vários danos mentais, muitas vezes irreversíveis."

"Quando se mantém uma pessoa totalmente isolada do mundo exterior, sem contato algum com familiares, com seu advogado ou com qualquer outra pessoa que não seja seu agressor ou agressores" - prossegue a psiquiatra -, "isto leva a vítima da tortura a sentir-se totalmente à mercê de seu verdugo, sem absoluto controle dos acontecimentos, passando a depender totalmente da vontade do outro. Este contexto é característico da tortura mental e do atual Regime Disciplinar Diferenciado (RDD), que está em operação no Estado de São Paulo."


Infâmia legalizada

A tortura, o tratamento desumano ou degradante e as penas cruéis são proibidos pela Constituição e por todos os tratados e convenções de direitos humanos de que o Brasil é signatário. O que se vê, no entanto, é a permanente anuência das autoridades fe[derais e judiciárias brasileiras aos desígnios fascistas que resultaram em sua criação.

Já em sua origem e em sua forma, o RDD é ilegal, criado em aberta afronta à Lei de Execuções Penais. Conforme denunciou à época Carmem Silva de Moraes Barros, a SAP não tem autoridade para criar regime de cumprimento de pena por meio de ato normativo. "Não cabe ao Poder Executivo, através de resolução, legislar sobre matéria penal, nem tampouco penitenciária" - explica a procuradora em seu artigo O RDD é um acinte.

Ao julgar o habeas corpus 400.000.3/8, em novembro de 2002, no entanto, o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) decidiu pela legalidade e constitucionalidade do RDD. Em dezembro de 2003, o governo federal promulgou a Lei 10.792, alterando a Lei de Execuções Penais para legalizar o RDD com pequenas alterações (a mais relevante delas é a previsão de que caberá ao juiz de execuções, e não mais ao diretor do presídio, determinar a inclusão de presos no regime).

Mesmo esta garantia, no entanto, vem sendo burlada pelas autoridades prisionais de São Paulo através do artifício do Regime Disciplinar Especial (RDE). Apenas em tese, o RDE é mais brando que o RDD. Mas como não tem qualquer fundamento legal, estando previsto apenas na resolução 59 da SAP, foge ao controle do Judiciário e do Ministério Público.

No final de fevereiro, os procuradores da República Luiz Fernando Gaspar Costa e Márcio Schusterschitz, membros do Conselho Penitenciário do estado, recomendaram ao então secretário Furukawa a extinção do regime. Na recomendação, os procuradores caracterizam o RDE como desumano e cruel e dizem que ele não difere, na prática, do RDD, a não ser pela já mencionada impossibilidade de fiscalização. O Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária, órgão do Ministério da Justiça, tem opinião semelhante e já considerou oficialmente o RDE inconstitucional.

Isabel Peres, da Acat, denuncia, ainda, que estão submetidos, na prática, ao RDD, presos comuns e sem qualquer vínculo com facções como o PCC nas penitenciárias de Casa Branca e Itirapina.


Endosso judicial

No âmbito do Judiciário, uma decisão no mínimo controversa foi tomada pelo desembargador Jarbas Mazzoni, vice-presidente do TJ-SP, em junho de 2005. Atentendo pedido do procurador-geral de Justiça, Rodrigo Pinho, ele proibiu que um canal de televisão do Chile entrevistasse, na prisão de Presidente Bernardes, Maurício Hernández Norambuena, cidadão daquele país. A entrevista havia sido previamente autorizada pelo corregedor-geral da Justiça paulista, o também desembargador José Maria Cardinale. O direito de dar entrevistas à imprensa, além de não constituir regalia nenhuma, foi assegurado até mesmo aos criminosos de guerra presos em Nuremberg.

Em 28 de junho deste ano, julgando o habeas corpus 44.049, impetrado em favor do mesmo Norambuena, a 6ª Turma do Superior Tribunal de Justiça considerou juridicamente possível a internação do preso no RDD além do prazo legal e sem que ele tenha cometido falta grave. O chileno está submetido ao regime desde fevereiro de 2003.

Os ministros Hélio Quaglia Barbosa e Nilson Naves consideraram que só a falta grave enseja o confinamento no RDD e que este não pode durar mais que 360 dias, mas os ministros Hamilton Carvalhido, Paulo Medina e Paulo Galloti entenderam que há duas hipóteses distintas: segundo sua interpretação - vitoriosa no julgamento -, os presos submetidos ao RDD por falta grave podem permanecer nele por no máximo 360 dias; mas aqueles recolhidos ao regime simplesmente por representarem, abstratamente, "alto risco para a ordem e a segurança do estabelecimento penal ou da sociedade", podem ser submetidos ao regime por tempo indeterminado.


Pode piorar

Ainda há, no entanto, quem considere o RDD excessivamente brando. No dia 17 de maio, a Comissão de Constituição e Justiça do Senado aprovou o PLS 179/05, do senador Demóstenes Torres (PFL-GO) que cria o Regime Disciplinar Diferenciado de Segurança Máxima (ver Um pacote fascista).

Neste regime, o preso poderá ficar isolado por até quatro anos, com no máximo duas visitas mensais (também sem contato físico) e banho de sol com duração máxima de duras horas diárias. O projeto prevê ainda a proibição do recebimento de qualquer tipo de alimento ou bebida fornecido por familiares e contato entre presos e advogados apenas uma vez por mês.

Há duzentos e trinta e dois anos, o marquês de Beccaria escrevia contra este tipo de severidade desmedida, denunciando seu caráter iníquo e contraproducente:

"Os países e os séculos em que se puseram em prática os tormentos mais atrozes" - dizia ele em Dos delitos e das penas, escrito em 1764 - são exatamente aqueles em que se praticaram os crimes mais horrendos. O espírito de ferocidade que ditava as leis de sangue ao legislador era o mesmo que colocava o punhal nas mãos do assassino e do parricida."

Uma parcela cada vez maior do aparato jurídico-policial brasileiro e seus representantes parlamentares parece ter se esquecido desta lição fundamental. Ou talvez, tendo-a muito clara, deseje exatamente contrariá-la.


Fonte: A Nova Democracia

GARANTISMO PENAL????


Copérnico, Sepúlveda, e o Garantismo Penal: bobos somos nós?


(02.03.09)

Por Daniel Agostini,
advogado (OAB/RS nº 62.022)

Na redemocratização do Brasil na década de 80, conhecemos uma intensa produção legislativa voltada para a defesa do cidadão e da pessoa humana, que começou com a Reforma Penal de 1984[1] e culminou com a promulgação da Constituição Federal de 1988, denominada, por isso mesmo, de Constituição Cidadã.

Já na década de 90 houve um recrudescimento legislativo representado por diversas leis[2] que demonstraram uma “política criminal vigorantemente repressiva”, muitas vezes reflexos de um casuísmo oportunista dos nossos parlamentares, marcado pelo “repressivo insano e pelo excesso de criações punitivas” (Alexandre Wunderlich, Muito Além do bem e do mal...in RHC nº 89.550/STF).

É “dessa dicotomia” entre as décadas de 80 e 90 que nasce o chamado “Garantismo”, representado pela obra de Luigi Ferrajolli, “Direito e Razão”, referindo-se às garantias que devem ter os cidadãos em face do Estado – visível naquela década de 80 -, além de criticar e refutar a criminalização de “tudo” e “todos”, vista no Brasil na década de 90, propugnando nada mais que o respeito à Constituição e demais garantias previstas nas leis de um Estado Democrático de Direito, devendo o Direito Penal ser reservado àquelas situações que violam bens jurídicos efetivamente sensíveis à vida em comunhão.

Contudo, vejo o termo “Garantismo” sendo usado inadequadamente por diversas pessoas como representativo de um amolecimento enojado ou enojável dos que lhe pregam, como se de fraqueza pessoal se tratasse, ou como se se tratasse de uma permissividade responsável pela criminalidade vista na sociedade.

Como alertam os doutores em semiótica como Marcelo Neves, “a referência simbólica (...) serve tanto ao encobrimento dessa realidade e mesmo à manipulação política para usos contrários a concretização e efetivação das respectivas normas”[3], a exemplo da utilização dos “direitos humanos”, que foi usado igualmente para legitimar a exploração dos indígenas na América, com Ginés Sepúlveda, como para repudiá-la, com Bartolomé de La Casas (1474-1566) [4].

O “Garantismo” também se indigna com a violência e a criminalidade vista na nossa sociedade atual, mas alerta para o respeito da presunção de inocência, o cumprimento da pena somente após transitada em julgada a sentença condenatória, não ser incriminado por fato anterior à lei incriminadora, e todas as demais garantias que exsurgem do denominado “Estatuto Constitucional da Defesa”.

Para quem foi algoz na ditadura, até entende-se a pejoração do termo, porque a imputação da pessoa humana em sua visão atomizada no centro do universo jurídico encerra tão ou maior mal do que causou o heliocentrismo de Copérnico da idade média para a Igreja, mas tal não se justifica para os outros, ou bobos somos nós?

(*) E.mail: daniel.agostini@ig.com.br

................................

[1] Lei 7.347/85, Lei 7.353/85, Lei 7.505/86, Lei 7.513/86, Lei 7.543/86, Lei 7.543/86.
[2] Lei 7.960/89, Lei 8072/90, Lei 8.038/80.
[3] A força simbólica dos Direitos Humanos. REDE – Revista de Direito do Estado, n. 4. Bahia, Salvador. www.direitodoestado.com.br.
[4] Os direitos humanos no descobrimento da América: verdades e falácias de um discurso. Revista Estudos Jurídicos. UNISINOS, n. 40. 2007. www.unisinos.br


Fonte Espaço Vital

JUSLEGAL, UMA OUTRA INSTÂNCIA CRÍTICA DO PODER JUDICIÁRIO


Juslegal diz que Judiciário brasileiro vem se afastando das leis

(02.03.09)

Criada em setembro passado por cidadãos de várias profissões, a Juslegal começou suas atividades com a realização da I Conferência Juslegal, que reunião os juristas Modesto Carvalhosa e Adão Sérgio do Nascimento Cassiano, no dia 16 daquele mês, com a participação de 520 pessoas. A gora, cinco meses depois, está impresso e começa a circular o primeiro jornal da entidade, com 16 páginas e abordando diversos temas referentes ao estado democrático de direito.

Na instalação, o advogado Mário Madureira, presidente da entidade, disse que "o objetivo é a difusão de informações, a promoção de debates e a defesa das garantias do estado democrático de direito, constantemente afrontadas por distorções, abusos e desvios na órbita dos poderes e governos e no setor privado, especialmente fornecedores de serviços a grandes contingentes da população, como os bancos, empresas de telefonia, cartões de crédito, planos de saúde, entre outros".

Em geral, tanto no setor público como no dos negócios privados, tais anomalias são facilitadas pela falta de transparência e pela fragilidade dos controles e sistemas de fiscalização da gestão e do gasto públicos, assim como pela desinformação, desorganização e escassa capacidade de agir consistentemente da cidadania.

Quase tudo isso é já bastante conhecido. "O novo - e desconcertante - foi constatar que o Judiciário vem se afastando das leis e da Constituição, criando hipóteses normativas contrárias às leis, julgando contra o conhecimento não só jurídico, ensinado nas universidades e na doutrina, mas também o de outras áreas, se alçando a uma perigosa condição de despotismo que não se pode mais ignorar" - foi, também, uma das manifestações de Madureira.

O jornal também traz uma espécie de dossiê especial, comentando anomalias constatadas em julgamentos de casos em que a Brasil Telecom é ré, como sucessora da CRT, além dos privilégios de que tal empresa tem desfrutado em alguns setores do Judiciário.

O jornal mostra a insegurança jurídica gerada pelas guinadas do STJ na jurisprudência consolidada, sem a fundamentação exigida pela Constituição e sem a observância de requisitos nunca dispensados pelos mesmos julgadores em quaisquer outros processos.

A publicação comenta também as palavras do ex-presidente do STJ, Humberto Gomes de Barros que - antes de se aposentar em julho do ano passado - afirmou que "o STJ, em lugar de ser um farol, estaria atuando como na brincadeira chamada ´banana boat´, que com bruscas guinadas derruba os viajantes no mar". Textualmente, o que Gomes de Barros disse à época foi que "o STJ foi concebido como um farol, e não como uma bóia à deriva" .

No jornal Juslegal, uma entrevista com Modesto Carvalhosa considera não apenas ilegal o critério dos balancetes mensais. O jurista define os critérios praticados pelo na guinada do STJ para aferir o preço de emissão das ações, como "surreais e inexequíveis", constituindo-se na "maior aberração jurídica que vi em toda a vida como profissional do direito".

Há ainda interessantes lições dos juristas Adão Sérgio do Nascimento Cassiano (que foi desembargador do TJRS até junho de 2008) e Lenio Streck (procurador de justiça), sobre os limites do ato de julgar.

Cassiano ensina que "a legitimidade e autoridade da decisão judicial depende de ser fundamentada e justificada por argumentação jurídica racional que respeite o conteúdo semântico mínimo do direito positivo vigente e os requisitos constitucionais", o que não vem ocorrendo com a guinada que o STJ deu ao mudar o norte decisório nas ações contra a Brasil Telecom.

E Lenio afirma que "interpretar a lei não é um ato de vontade do juiz, não cabendo ao julgador se sobrepor ao que determinou o legislador, caso em que se estará diante de decisionismo, não aceitável no estado democrático de direito".

O jornal Juslegal aborda também o caso das irregularidades das Câmaras Especiais do TJRS, somente em parte corrigidas pelo TJRS no final do ano passado, depois de a instituição perceber que iria ter desfecho negativo no CNJ, em razão da reclamação de 1.297 advogados, protocolada em maio de 2008.


Serviço

* Link do jornal:
http://www.juslegal.com.br/Arquivos/Jornal%20JUSLEGAL.pdf


* Telefones da Juslegal Associação Justiça e Legalidade:
(51) 3212-0343 e 3012-0838

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